Há sempre duas histórias
para contar acerca de uma pessoa; a verdade e a mentira. O meio-termo é uma
ilusão de ingénuos. A meia-verdade não é, como o próprio nome engana com
malícia, a metade de uma verdade mas sim a totalidade de uma mentira. Omitir,
deliberadamente, informação que influencia a interpretação de uma afirmação é
sempre a intenção de enganar quem interpreta. Omitir não é mentir? Que acredite
nesse engano quem o quiser. É possível não revelar a verdade sem afirmar
directamente a mentira? É. Quem o faz, fá-lo conscientemente e conhece como
funciona a percepção imperfeita da mente. Há quem domine todo esse exercício de
equilíbrio delicado com ironia, sarcasmo e cinismo, com a mesma habilidade de
um acrobata exímio em questões de equilibrismo. Nesse constante desafio da
queda não há rede entre o acrobata e o fundo do mundo. Na queda, a verdade mata
e a mentira morre, a crueldade da realidade é um acidente do qual ninguém nos
socorre. Todas as pessoas mentem? Claro que não…
6 comentários:
Só duas histórias? Preto ou branco? E a imaginação é verdade ou mentira? Sim, o meu nome do meio é Ingenuidade. [ironia com uma pontinha de sarcasmo?] Lembrei-me desta pub da Folha de S. Paulo (http://youtu.be/6t0SK9qPK8M): "É possível contar um monte de mentiras dizendo só a verdade".
Como seria o mundo se todos fôssemos transparentes? Bem, deixaria de haver poker... olha que chatice [+ ironia?]. Ironizar também é mentir? [sarcasmo com uma pontita de cinismo?]
Acreditar não tem nada a ver com verdades ou mentiras. Acreditar é dar crédito (com mais ou menos garantias) é crer (e querer também).
Mas tu saberás melhor que eu destas coisas, afinal de contas, dominas a arte da retórica com requintes de mestria ;)
A verdade e a mentira são os extremos absolutos que representam a ocorrência imparcial dos acontecimentos; nem uma nem outra, nesses extremos absolutos, dependem da interpretação humana; as coisas são o que são, para além dos limites do nosso conhecimento em relação a elas. Feliz ou infelizmente, ninguém possui omnisciência para conhecer o estado absoluto dos acontecimentos. Assim, temos de construir a nossa realidade alicerçada em interpretações e perspectivas.
A imaginação, assente no pressuposto de que origina ideias e conceitos impossíveis de encontrar e/ou verificar naquilo a que geralmente se aceita como realidade, é ficção. Na ficção, a dúvida entre o que é verdade ou mentira não passa de uma falsa questão; nesse domínio, a verdade e a mentira são que o autor quiser que sejam, um poder que ninguém detém na realidade.
Em certas circunstâncias, o próprio acto de acreditar é uma mentira que se impõe quando os crentes se mostram predispostos a aceitar opções que desafiam a estrutura mais básica do raciocínio lógico (a tal de fé que não necessita de provas).
O vídeo que mencionaste é uma interpretação possível para o que eu disse aqui: "É possível não revelar a verdade sem afirmar directamente a mentira? É."
No estado absoluto dos acontecimentos, não existe mentira nem verdade, porque uma é consequência da outra e para que raio servirão as duas onde as coisas são o que são? É na perspetiva subjetiva daquilo a que chamamos "realidade" que a verdade e a mentira acontecem. Neste mundo faz-de-conta, a "realidade" é uma ilusão. Quem é que nos garante que isto é diferente de uma história inventada? És tu que dizes "não importa se o que acreditamos não é verdade, importa apenas que a crença sonhadora nos sirva melhor do que os factos da realidade". Pois bem, acrescentaria ainda que importa muito mais a forma como acreditamos do que aquilo em que acreditamos. E acreditar pode alterar a realidade. E de que maneira... a mentira tem essa capacidade? e a verdade?
A realidade não é subjectiva, mas sim a nossa interpretação da realidade. Isto que acabei de dizer pode ser verdade ou mentira, dependendo da interpretação de quem ler. No entanto, qualquer que seja a interpretação, não altera a realidade absoluta (as coisas tal como são, independentemente do conhecimento de quem interpreta), e apenas influencia a realidade relativa (a interpretação que se faz das coisas apreendidas). A verdade e a mentira não são consequência uma da outra, mas sim a recusa uma da outra (os tais extremos). Pedra será sempre pedra, mesmo que um observador a interprete como pau. Mas, então, e uma árvore fossilizada? É pedra ou pau? Quem quiser, que interprete como entender, a ver se isso altera a constituição molecular do fóssil. Afinal, o que sei eu? Todas as coisas que eu disse, até aqui, podem ser mentira (o que, ironicamente, fará com que algumas coisas sejam verdade... ou não... ou sim... ou não...).
Mas que grande embrulhada! Para todos os efeitos, não conhecemos a realidade sem ser pelo nosso interface, dá ser sempre subjetiva.
Consequência ou recusa, a verdade anda sempre de mãos dadas com a mentira, que só fazem sentido nesta "realidade relativa", subjetiva ou whatever. Posto isto, esqueçamos a tal da realidade perfeita, absoluta, objectiva e concentremo-nos no que temos, pode ser?
Estive a ver os extras do dvd da "Invenção da Mentira" do Gervais e há uma espécie de prequela passada na pré-história que reproduz o momento exato em que ocorre a mutação genética no cérebro do homem das cavernas que muda o curso da humanidade para sempre. Gosto imenso do caráter rigoroso e altamente científico desta alegoria (não consigo largar a ironia). O "gene da mentira" foi essencial na escalada evolutiva, tanto que hoje em dia não existe alguém que não o tenha. Pode-se é evitar dar-lhe mau uso. Porque também dá para fazer coisas produtivas, como imaginar, sonhar, e ironizar (esta até pode não ser das mais produtivas, mas é divertida e uma boa dose de diversão ajuda na produtividade).
Só estou aqui para provocar conflito (ahah). O resto são palavras, e as palavras podem ser aquilo que cada um quiser.
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