Somos livros de ler e deitar fora. Uma leitura sem vontade que se despacha em menos de um quarto de hora. Num qualquer quarto, a qualquer hora. Somos rapazes disfarçados de raparigas que se disfarçam de rapazes para conquistar raparigas que apenas querem ser conquistadas por rapazes que se disfarçam de homens. E essas raparigas apenas gostam de se disfarçar de mulheres. É o que eu digo para o espelho. O que é que queres, caralho? Somos todos assim, gajos e gajas, umas putas travestidas, sem coração, que aceitam dinheiro de qualquer mão. O corpo não interessa. Quando já não serve para uma pessoa escolhe-se outra que não seja essa. Muda-se a pele, está rota, tingida, apertada, fora de moda, ou qualquer outro nada — que se foda — e veste-se outra peça. O corpo antigo é saco com restos de comida, que se deixa atrás do grande contentor de lixo, em cima do charco de mijo de cão que se evapora do chão.
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